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Como ocorre a renovação automática dos contratos de arrendamento rural?

  • Foto do escritor: Esthefany Malonyai Cavalieri
    Esthefany Malonyai Cavalieri
  • 28 de set. de 2022
  • 6 min de leitura


O contrato de arrendamento rural é reconhecido por lei como um contrato agrário e é disciplinado pela Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra) e seu Decreto regulamentador nº 59.566/66.


Conforme previsto no artigo 3º do referido decreto, “arrendamento rural é o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de imóvel rural, parte ou partes do mesmo, incluindo, ou não, outros bens, benfeitorias e ou facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária, agro-industrial, extrativa ou mista, mediante, certa retribuição ou aluguel, observados os limites percentuais da Lei”.


De acordo com a definição legal, o contrato de arrendamento rural possui as seguintes características:


  1. Arrendador: proprietário, possuidor ou quem tenha a livre administração de um imóvel rural;

  2. Arrendatário: aquele que usará o imóvel rural para fins de exploração de atividade rural;

  3. Objeto: uso e gozo de imóvel rural para fins exploração de atividade rural;

  4. Contraprestação: retribuição ou aluguel;

  5. Prazo: determinado ou indeterminado;

  6. Forma: verbal ou escrita.


O contrato de arrendamento rural é, portanto, um negócio jurídico em que o arrendador cede a posse, uso e gozo de um imóvel rural a outrem, denominado arrendatário, para fins de exploração rural, por prazo determinado ou não, recebendo, como contraprestação, uma retribuição ou aluguel.


As normas aplicáveis aos contratos agrários possuem natureza de direito público em razão do objeto de proteção que, em linhas gerais, é garantir e assegurar a função social da propriedade.


Sobre o tema, Arnaldo Rizzardo¹ ensina que:


“Assim, apesar do enquadramento no direito privado, as normas ou do sistema jurídico agrário estão impregnadas de regras de ordem pública, mais que em vários outros ramos do direito privado, com evidente proteção daquele que cultiva a terra. Por isso, não há exagero em reconhecer que, na declaração das vontades nos contratos, devem as partes submeter-se a ditames que retiram a plena liberdade em estabelecer direitos e obrigações, sob pena de invalidade das avenças. É o que se dá, v.g., no arrendamento e na parceria rurais, em que a liberdade contratual não pode desrespeitar os prazos mínimos estabelecidos em lei. Conclui-se que, embora a classificação como direito privado, marcante é o aspecto publicístico, com tendência protetiva do produtor rural ou daquele que está na exploração da terra.”

O Estatuto da Terra e seu decreto regulamentador instituem direitos e condições específicas às partes que contratam arrendamento rural.


Exemplo disso é a previsão contida no artigo 95, incisos I e II do Estatuto da Terra, que, ao regulamentar o prazo de duração dos contratos de arrendamento, determina que a extinção deve ocorrer sempre depois de ultimada a colheita; assim como, se for convencionado por tempo indeterminado, presume-se feito no prazo mínimo de 3 anos. Confira-se:


Art. 95. Quanto ao arrendamento rural, observar-se-ão os seguintes princípios: I - os prazos de arrendamento terminarão sempre depois de ultimada a colheita, inclusive a de plantas forrageiras temporárias cultiváveis. No caso de retardamento da colheita por motivo de força maior, considerar-se-ão esses prazos prorrogados nas mesmas condições, até sua ultimação; II - presume-se feito, no prazo mínimo de três anos, o arrendamento por tempo indeterminado, observada a regra do item anterior (…).

O prazo final do contrato de arrendamento ganha grande relevância e proteção legislativa, pois os incisos IV e V do artigo 95 do Estatuto da Terra e o artigo 22, § 1º do Decreto nº 59.566/66 expressamente instituíram ao arrendatário o direito de preferência à renovação do contrato de arrendamento.


Veja o que diz os referidos artigos:


Lei nº 4.504/1964 (Estatuto da Terra) Art. 95. Quanto ao arrendamento rural, observar-se-ão os seguintes princípios: (...) IV - em igualdade de condições com estranhos, o arrendatário terá preferência à renovação do arrendamento, devendo o proprietário, até 6 (seis) meses antes do vencimento do contrato, fazer-lhe a competente notificação extrajudicial das propostas existentes. Não se verificando a notificação extrajudicial, o contrato considera-se automaticamente renovado, desde que o arrendador, nos 30 (trinta) dias seguintes, não manifeste sua desistência ou formule nova proposta, tudo mediante simples registro de suas declarações no competente Registro de Títulos e Documentos; (Redação dada pela Lei nº 11.443, de 2007); V - os direitos assegurados no inciso IV do caput deste artigo não prevalecerão se, no prazo de 6 (seis) meses antes do vencimento do contrato, o proprietário, por via de notificação extrajudicial, declarar sua intenção de retomar o imóvel para explorá-lo diretamente ou por intermédio de descendente seu; (…)
Decreto nº 59.566/66 Art. 22. Em igualdade de condições com terceiros, o arrendatário terá preferência à renovação do arrendamento, devendo o arrendador até 6 (seis) meses antes do vencimento do contrato, notificá-lo das propostas recebidas, instruindo a respectiva notificação com cópia autêntica das mesmas (art. 95, IV do Estatuto da Terra). § 1º Na ausência de notificação, o contrato considera-se automaticamente renovado, salvo se o arrendatário, nos 30 (trinta) dias seguintes ao do término do prazo para a notificação manifestar sua desistência ou formular nova proposta (art. 95, IV, do Estatuto da Terra).

Da leitura dos dispositivos legais ora transcritos, extrai-se as seguintes conclusões:

  1. O arrendatário tem direito de preferência à renovação do contrato de arrendamento;

  2. Em razão do referido direito de preferência, o arrendador deverá, em até 6 meses antes do vencimento do contrato, notificar o arrendatário acerca das novas propostas de arrendamento eventualmente recebidas ou de sua intenção em retomar o imóvel para explorá-lo diretamente ou por intermédio de algum de seus descendentes;

  3. Se o arrendatário não for notificado no prazo estabelecido, o contrato de arrendamento é automaticamente renovado.


Importante ressaltar que o Decreto nº 59.566/66 estabelece formalidade específica à notificação do arrendatário. Conforme previsto no § 3º do artigo 22, as notificações deverão ser feitas através do Cartório de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou por requerimento judicial.


Acontece que, em muitos casos, o direito de preferência à renovação do arrendamento é preterido. Nesses casos, a intervenção judicial pode ser necessária para salvaguardar o direito do arrendatário.


Sobre o tema, entende o Superior Tribunal de Justiça que:


RECURSO ESPECIAL. DIREITO AGRÁRIO. CONTRATO DE ARRENDAMENTO RURAL. PRAZO DETERMINADO. NOTIFICAÇÃO. ARRENDATÁRIO. SEIS MESES ANTERIORES. AUSÊNCIA. RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA. NORMA COGENTE. ESTATUTO DA TERRA. MODIFICAÇÃO PELAS PARTES. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. O Estatuto da Terra prevê a necessidade de notificação do arrendatário seis meses antes do término do prazo ajustado para a extinção do contrato de arrendamento rural, sob pena de renovação automática. 2. As partes não podem estabelecer forma alternativa de renovação do contrato, diversa daquela prevista no Estatuto da Terra, pois trata-se de condição obrigatória nos contratos de arrendamento rural. 3. Em se tratando de contrato agrário, o imperativo de ordem pública determina sua interpretação de acordo com o regramento específico, visando obter uma tutela jurisdicional que se mostre adequada à função social da propriedade. As normas de regência do tema disciplinam interesse de ordem pública, consubstanciado na proteção, em especial, do arrendatário rural, o qual, pelo desenvolvimento do seu trabalho, exerce a relevante função de fornecer alimentos à população. 4. Não realizada a notificação no prazo legal, tem-se o contrato como renovado. 5. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 1277085 AL 2011/0215120-2, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 27/09/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/10/2016)

O Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso comunga do mesmo entendimento:


AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA DE CONTRATO DE ARRENDAMENTO RURAL – ARGUIÇÃO PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO – TESE NÃO INVOCADA EM PRIMEIRO GRAU – SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA - CONTRATO AGRÁRIO – INCIDÊNCIA DAS NORMAS DO ESTATUTO DA TERRA – MODIFICAÇÃO DE DISPOSIÇÕES CONCERNENTES À RENOVAÇÃO PELAS PARTES – IMPOSSIBILIDADE – NORMA COGENTE – AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PREMONITÓRIA NO PRAZO LEGAL – RENOVAÇAO AUTOMÁTICA – AUTORES/ARRENDATÁRIOS QUE PREENCHERAM OS REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONCESSÃO DA TUTELA PROVISÓRIA – DECISÃO AGRAVADA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. O Agravo de Instrumento é um recurso “secundum eventum litis” e, portanto, tem seu espectro de análise restrito ao acerto ou desacerto técnico da decisão agravada, não podendo extrapolar para questões de fundo, sob pena de supressão de instância, de modo que toda e qualquer pretensão lateral afeta à discussão da competência territorial (relativa) do Juízo, deve ser suscitada em Primeiro Grau. 2. “O Estatuto da Terra prevê a necessidade de notificação do arrendatário seis meses antes do término do prazo ajustado para a extinção do contrato de arrendamento rural, sob pena de renovação automática. As partes não podem estabelecer forma alternativa de renovação do contrato, diversa daquela prevista no Estatuto da Terra, pois trata-se de condição obrigatória nos contratos de arrendamento rural” (STJ - Terceira Turma - REsp 1277085/AL, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 27/09/2016, DJe 07/10/2016). (TJ-MT 10185779420218110000 MT, Relator: JOAO FERREIRA FILHO, Data de Julgamento: 12/07/2022, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/07/2022)

Desse modo, se o arrendatário não for notificado no prazo legal, o contrato será automaticamente renovado. A renovação importa em nova vigência do contrato anterior em todas as suas cláusulas.



Ficou com alguma dúvida? Pode entrar em contato comigo que te ajudo: esthefany@trierweiler.com.br




Referências bibliográficas

[1] ARNALDO RIZZARDO (Curso de Direito Agrário, 2ª ed., São Paulo: RT, 2014, p. 26)

 
 
 

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